O que você sente?, 2023
Vídeo instalação com projeção mapeada e vídeo de 2″
5 placas de cerâmica de aproximadamente
30 x 22 cm
No momento em que estou produzindo uma peça é como se só existisse eu e a argila no mundo todo. Tudo ao redor é um borrão, as conversas são ruídos, toda minha atenção e interesse pertencem àquele pedaço de barro. E como ao meditar, o foco não é o pensamento, mas a sensação. Sentir a temperatura, a textura, a maleabilidade, o ponto limite antes da quebra. Essa sensação traz um sentimento de cuidado, zelo, também leveza e liberdade.
No meio desses sentimentos, pensamentos interrompem o transe em cada parte do processo. “O que eu quero fazer?”, a famosa folha em branco que é uma decisão nem sempre racional, mas que advém de como me sinto no momento. Meus sentidos entendem mais como me sinto do que meu racional. Mas é sempre sobre sentimentos, do começo ao final do processo. O do observador, para que eu consiga passar através de sua imersão, uma mínima fração do que sinto ao fazer cerâmica. E dos meus, pela minha falta de jeito com interações e palavras, mas naturalidade ao me expressar com a cerâmica, para que me conheçam, entendam, acolham, olhem pra mim e enxerguem através de mim por um minuto. Afinal, ela é a projeção de todas as experiências, pessoas, dias e tudo que passou na minha vida,
de quem eu sou sem nem mesmo saber quem sou.
Desse modo, ao querer transmitir e receber carinho, não há outra escolha que encaixe melhor do que a cerâmica. Antes do meu primeiro contato com a argila, não esperava que ela fosse significar o que significa para mim hoje. Mas na primeira aula, tudo mudou, ao fazer o primeiro movimento, memórias guardadas de infância ressurgiram, a clássica minhoquinha de massinha. Não percebi no começo o quão similar o processo de aprendizado e produção se parece com o processo de conhecer um ser vivo. É uma relação de carinho.
No processo de conhecer uma pessoa, um pet, uma planta, procura-se estudar, conhecer, perguntar sobre, entender o funcionamento, as preferências e o que fazer para cuidar bem deles. Ao tocar a argila, é possível entender suas necessidades, “você precisa de água?”, “você precisa de vento?”, ela diz para você, plantas e argila. É como dar espaço e tempo para se estruturar e erguer, sem cruzar limites, pessoas e argila. É acariciá-la com pincel, esponja, pedra e até os dedos como pentear um gatinho. E queimar para eternizá-la, como o amor eterniza os seres em nós. Afinal, “O amor é fogo que arde sem se ver”.
A cerâmica é afeto e diálogo. É uma companhia que quero levar comigo em todos os meus trabalhos, pois ela se tornou uma extensão de mim. Pois, é o único momento em que me sinto completa, fazendo alguma coisa que gosto e sinto que me encaixo, é quando percebo que eu e ela nos fundimos em uma coisa só, uma conexão.
Camila Chaves, 1994, Campo Grande, Brasil. Vive e estuda em Porto Alegre, Brasil.
Trabalha com cerâmica, fotografia, projeção mapeada, vídeo e artesanato. Explora a
interação da projeção mapeada e da cerâmica por meio de videoinstalações.
Estudante Bacharel na Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
Instagram: mila.chaves