Das pedras ao jardim, passagens.
“No tremular cinzento de uma madrugada de primavera, quando pássaros sussurram em misteriosa cadência no arvoredo, você nunca sentiu que eles falam de flores aos companheiros?
Para a humanidade, a apreciação das flores foi sem dúvida contemporânea dos poemas de amor...
Ao oferecer a primeira guirlanda à sua amada, humanizou-se e alçou acima das rudes necessidades da natureza.
Penetrou o reino da arte quando percebeu o sutil uso do inútil”.
Kakuzo Okakura. Livro do chá, 1906
(Trecho do texto de Elias Muradi)
A imagem capturada de Okakura, anunciando um dia de primavera, traz o estado preparatório de operações iniciais, onde a
natureza desperta o mundo. Um cenário de entre, a um passo de viver o dia em sua plenitude e complexidade. Esse suspiro poético entre a noite e o dia, unido ao ajuste de nossas almas ao acertar os passos, sugere o Jardim como lugar comum. Um ambiente de nuances e formas transitórias, para pensar a exposição coletiva que inaugura o espaço “Move”.
As flores e plantas ensaiam, assim como nós, suas buscas em condição de sobrevivência. Logo, é legitimo pensar que os vestígios
das tentativas durante o processo nos aproximam delas mais do que as obras prontas. Maurice Maeterlinck, escritor belga, acredita que todas as flores se empenham na realização da sua obra. A partir dessas imagens, vemos nascer o espaço “Move”. Gestado na convivência entre as artistas Ana Rey, Marinalva Rosa e Rita Heckert.
Estamos diante da experiência coletiva em sua plenitude, e nem se pretende dizer que tudo são flores nesse caminho. No entanto,
colhe-se algo de beleza rara: o sentimento cultivado, maturado e fértil que se materializa nessa exposição. Reunindo pinturas, desenhos, esculturas, manufaturas têxteis, entre outras expressões artísticas. A maioria das obras refere-se às produções recentes das artistas, talvez por estarem em sintonia com a mudança de casa e por juntas tramarem em seus âmagos aquilo que poderá vir a ser.
E para mim, é uma alegria estar próximo a elas nesse momento. Agradeço o convite para contribuir na concepção e também de
expor meus trabalhos nessa coletiva. De certa forma, sou um observador e admirador dessas artistas há muito tempo.
Tornar visível pode ser a prática de mediação entre as incertezas, impermanência e transitoriedade.
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Elias Muradi, artista visual e professor, setembro de 2023.
