Sirlene Giannotti

Sirlene Giannotti

Vestes, 2023
Cerâmica: modelagem em argila branca e óxidos, queima em 1280°C
Dimensões variadas

Vestes

O processo criativo que envolveu este trabalho derivou de um desejo de relacionamento profundo entre intenções, gestos e materialidade. E deriva também, da confiança na compreensão de que este envolvimento é capaz de promover o alcance simbólico em configurações expressivas.
A intimidade com a matéria coloniza imagens, multiplica vontades e impulsos de sondagens.  imersões, entranhamentos e deslizes sobre a pele da terra.
Há mais de vinte anos busco esta realização atendendo ao chamado de ter a argila girando sobre a roda do torno. Antes desejei conquistar a simetria nos volumes. Meu foco estava voltado ao objeto. Agora o chamado voltou-se para a tarefa de tornear um volume maior de barro, não para elevar paredes, mas sim, para esparramá-lo na roda de oleiro e experimentar o deslize das mãos. O foco estava agora voltado para o processo resultando em discos planos.
O deslizar dos dedos sobre esta superfície imprimiram rotas concêntricas de aproximações e afastamentos em relação ao eixo. Este procedimento dominou os primeiros passos desta criação.
Os discos marcados com os sulcos dos dedos e linhas de arranhamentos de unhas dormiram descobertos uma noite tranquila sobre as bancadas. Registro de rodopios, cirandas que aguardavam novos movimentos.
Desidratadas estas chapas de barro abriram em rachaduras. Eram fendas que decompunham as partes da roda em faixas. Pistas para novas possibilidades construtivas. Dispararam vontades de elevação. Mantinha-se o desejo de fazer a imagem rodar, de manter os registros dos rodopios. E a edificação se fez circular, mas sem simetria. Furações de argila que se erguiam como solicitado pelo envolvimento, iam se afunilando.
Este engajamento com a matéria, que aqui chamo de envolvimento, compõe-se de dados empíricos, acontecimentos, que se relacionam aos significados que são simultaneamente atribuídos pela instância da  imaginação que alcanço no processo. É precisamente neste acontecimento onde os atributos da materialidade estão em envolvimento com a presença da minha humanidade, que se dá a especificidade complexa da criação. Que resulta da passagem deste portar de expansão da percepção em imaginação criativa:  mundo físico em comunhão com o mundo simbólico.
Assim, este processo de criação configurou-se como uma escalada de ascensão ao centro, ao corpo, ao interior, à intimidade. Aos poucos os corpos se insinuaram na configuração. E revelaram-se as vestes de um Ser único, feito de terra e imaginação.

Sirlene Giannotti

Sirlene Giannotti (1966, São Paulo, Brasil) trabalha há 25 anos em seu próprio estúdio de arte cerâmica no Tapir ateliê, em São Paulo. Aqui conduz aulas, workshops e produz seu próprio trabalho em peças artísticas e utilitários de inspiração lúdica. Com fidelidade à arte cerâmica, Sirlene voltou seus estudos também para a arte. É graduada em antropologia (PUCSP) e arte-educação (USP) com atuação na formação de professores de todo país. Na perspectiva da fenomenologia orientou suas pesquisas de mestrado (2008) e doutorado (2023), ambas na Universidade de São Paulo, na busca de compreensão do papel das relações entre a argila e a imaginação humana na formação pessoal. Assim, alternando mergulhos nos estudos e nas produções criativas da arte, Sirlene é buscadora do simbolismo imaginário da terra.

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